Vísceras
Momento introspecto. Isolamento, uma fase minha comigo mesma. Não anda tendo espaço para muito agregar, me sinto estéril pro mundo. Não consigo ou não quero parir pra fora. Tô grávida de mim. Gestando pra dentro.
Um grande barrigão interno, com tentáculos invisíveis suga tudo ao redor e joga pra dentro, me alimentado, me preparando sei lá pra que... Produzo, trabalho, penso, leio, limpo, cozinho, brinco, rio, escuto e assisto o fora, rapidamente absorvo... Estou me nutrindo? Talvez...
Há algo aqui dentro. Não sei ainda o que é esse algo, mas sei que já é algo. Não o conheço, mas ele me conhece... Ele está em vantagem sobre mim, porque convive e vive em mim, sabe quem sou, me conhece! E eu, desavisada, nada sei.
O que? Quem é? O que quer? Não sei...
Esse sentir me deixou meio desesperada, impaciente, receosa.
Medo e ansiedade bateram freneticamente à minha porta. Queriam entrar, se instalar, se aboletar folgadamente dentro de mim... Não deixei! Disse: “Aqui não! Aqui você não se cria... Vai-te embora e não ouse voltar. Não insista. Definitivamente, não tem pão velho pra você!”
No emaranhado de perguntas, dúvidas e incertezas, um lampejo de lucidez me guiou. Me toquei que não adiantava temer o desconhecido, tampouco tentar controlá-lo, menos ainda evitá-lo. Lembrei que ele não pediu licença, simplesmente brotou alheio a mim... Aí decidi, escolhi relaxar no descontrole e caminhar momento a momento na corda bamba do desequilíbrio, administrando para não cair e me espatifar no chão das certezas que não existem...
Não desejava, nem estou segura, mas saquei que não tenho alternativa melhor. É fluir e viver o que a vida decidiu me apresentar, ou ser soterrada pelo invisível, incompreensível e indecifrável...
Sigo fluindo. Fazendo o que dá pra fazer.
Mas o ponto, o importante, é decidir diariamente por mim, pela mínima sanidade mental e integridade física... Aceitar que é isso nesse momento, é o que há. Me tocar que é isso que eu tenho pra hoje. Que é isso que eu sou hoje. Que é só isso que eu consigo ser agora, e que talvez esse só, nesse agora, já seja muito. E que se não tá bom, tudo bem, o mundo não acaba por isso não!? E que dá pra fazer diferente, dá pra ser diferente, dá pra reconstruir, refazer, renascer, retornar... Depois, daqui a pouco, logo mais... Simplesmente Dá!
Foi me ouvindo, escutando o eloquente grito silencioso do não saber, que me toquei que eu sou o que há de melhor no momento. Eu sou o que dá pra fazer, o que anda dando pra ser e ter. E que, talvez isso que eu sou, não seja nem de longe o que o meu sonho sonhou que eu fosse ser um dia, mas que é como tá dando pra ser, e que eu não posso evitar, não consigo esconder, porque quanto mais eu guardo, mais aparece, quanto mais afasto, mais próximo fica, quanto mais apago a luz, mais brilha, quanto mais encubro, mais me exibe.
Paula Maria
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